Quando estava no Mestrado na UFSJ, apresentei um trabalho sobre Kunstlerroman, o romance do artista que se faz artista, com meu querido amigo Rafael Senra, escritor e autor de quadrinhos.
Lembro que discutimos que determinadas culturas não conseguem reconhecer um desenho em 2D, pois é preciso um treinamento para ver em uma folha de papel ou em um quadro a existência da profundidade e a correlação com o objeto real.
E se nos aprofundarmos na história da arte ocidental, veremos que o cubismo é um passo além. Muitas e muitas pessoas já me disseram que não gostam do Picasso, que consideram uma arte feia, sem sentido, sem a beleza de um Monet ou a força de um Van Gogh.
Um dos poemas de Fernando Pessoa (como Álvaro de Campos) que mais gosto se chama A Passagem das Horas. Álvaro de Campos é o protótipo do sujeito moderno, vivendo entre a novidade da tecnologia, o tédio e o desencontro entre as suas sensações e os outros.
É certo que Álvaro de Campos não é Alberto Caiero, aquele outro (outro nome) – heterônomo- que Fernando Pessoa (o ego) chamava de mestre (o Self).
Mas estava dizendo sobre o Passagem das Horas. Ao rever o vídeo abaixo me lembrei deste trecho: Nem tomar nota do que vi para depois fingir que o vi.
Trecho de Passagem das Horas
“Viro todos os dias todas as esquinas de todas as ruas,
E sempre que estou pensando numa coisa, estou pensando noutra.
Não me subordino senão por atavismo,
E há sempre razões para emigrar para quem não está de cama.
Das serrasses de todos os cafés de todas as cidades
Acessíveis à imaginação
Reparo para a vida que passa, sigo-a sem me mexer,
Pertenço-lhe sem tirar um gesto da algibeira,
Nem tomar nota do que vi para depois fingir que o vi”
Nem tomar nota do que vi para depois fingir que o vi
Tirar uma foto é tomar uma nota, é guardar uma lembrança, é registrar um momento, certo?
Com os telefones espertos (smartphones) temos à nossa disposição a possibilidade de registrar todo momento. Antes não. Antes tínhamos que escolher ocasiões especiais, posto que comprar um filme para uma câmera e revelá-lo não saia barato.
Hoje podemos tirar foto de tudo. E encher o nossos HD’s e cartões de memória com megabits e pixels de sensações desencontradas.
Como no vídeo abaixo, tomar nota do que vi para tentar ver de verdade, quem sabe, outro dia… pois afinal, estamos presentes no momento quando queremos guardar algo para o futuro? Ou estamos perdendo o presente na busca de uma memória do passado no futuro?
Como diz o título do vídeo: “Eu esqueci o meu celular”. Quanto tempo você consegue esquecer o seu?
Van Gogh foi um artista genial. Disto não temos dúvida. Foi também um artista incompreendido. Na verdade, até a sua vida ainda não foi completamente compreendida porque alguns dizem que ele teria cometido suicídio e outros dizem que ele teria levado um tiro (meio) acidental de adolescentes que adoravam zombar dele.
Na nossa seção de Artes, aqui do nosso site sobre a Psicologia da Atenção Plena, gostaria de compartilhar um quadro que mostra a capacidade de Van Gogh de ver o que ninguém viu. A turbulência.
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